Era o fim de 2020 e a minha cabeça andava uma verdadeira confusão, escrever era o meu alívio.
Lembro bem que era madrugada e eu sentia como se estivesse, literalmente, desaparecendo. Que, no dia seguinte, eu teria ficado completamente invisível e a minha família não me enxergaria mais.
E então esse texto, logo aqui embaixo, surgiu em meio a uma confusão de palavras digitadas diretamente no meu perfil do twitter (era esse o nome na época, então vamos chamar assim). É um dos textos que eu mais gosto, entre todos que já escrevi, espero que curtam.
O menino que ficava invisível
Era uma vez, um menino que morava em um castelo no alto de uma colina. Seus pais eram os comerciantes mais ricos de toda a região e estavam sempre atrás de novos negócios. Por isso, o menino ficava muito tempo sozinho.
Nos dias em que os pais viajavam, a governanta era a responsável por alimentar e garantir que ele frequentasse a escola do vilarejo. Ela era uma mulher que fazia o seu trabalho muito bem feito, o pequeno menino nunca faltava a aula e sua alimentação era muito saudável.
Só que ele se sentia diferente de todas as outras crianças. Em alguns momentos de sua vida era como se ninguém pudesse enxerga-lo. Dentro do castelo, sendo ignorado frequentemente pela governanta, ele até não se importava muito.
O menino ficava triste, de verdade, em todas as vezes que os seus amigos o faziam se sentir assim.
Naquela tarde eles iriam brincar na pracinha, o menino comprou sorvete pra todo mundo, por alguns momentos ele se sentiu amado.
Pode ouvir seus amigos chamando seu nome, dizendo o quão querido ele era e como era uma parte fundamental do grupo. Enquanto passava em frente a uma vitrine, viu seu reflexo e o seu sorriso estava brilhante.
Durante o restante do caminho, ouviu os amigos contarem histórias e rirem juntos. Aos poucos, bem devagarinho mesmo, foram parando de falar com o menino. Montaram duplas para as brincadeiras que fariam, e ele não estava em nenhuma delas.
Olhou para baixo e viu a ponta dos seus tênis ficando cada vez mais apagada. Começaria tudo de novo. Ele tentou puxar um assunto e houveram duas ou três repostas. Teve a impressão de ver a cor voltando aos seus pés.
O tempo passou e o menino cresceu, ele vivia desesperadamente atrás de atenção. Tinha medo de sumir para sempre, sentia que precisava fazer coisas que o tornassem inesquecível.
Por um tempo isso funcionou, mas quando todos os amigos dele cresceram e seguiram com suas vidas, o menino ficou para trás. Às vezes alguém ligava, e ele sentia um pouquinho de suas cores voltarem, mas na maioria dos dias ele que procurava por todos aqueles com quem se importava.
Dia após dia, ele viu seu corpo desaparecendo. Seu reflexo não podia ser visto em nenhuma superfície e até mesmo de seu nome ele estava esquecendo.
Cansado de tudo aquilo, ele pensou em fugir, talvez em outro lugar, outras pessoas poderiam vê-lo enfim. Quando estava atravessando a ponte sobre o rio, encontrou uma menina toda azul, com um pote de tinta azul nas mãos.
Ela também pode ver o menino invisível e ficou triste porque ele ainda não havia descoberto o segredo da vida.
Enquanto ele se aproximava a menina preparou o pote cautelosamente e, em um movimento rápido, jogou toda a tinta que ainda estava ali sobre o menino.
Ele ficou assustado e até um pouco irritado com ela, mas tudo passou quando um velho amigo o viu e parou para conversar por alguns minutos.
Quando o amigo se foi, e com uma cara de espanto, perguntou para a menina: "por causa da tinta que ele conseguiu me ver?"
"É claro!", ela respondeu confusa, não entendia como ele poderia não saber disso. "E como você pode me ver?", o menino perguntou pensando se alguma coisa faria sentido naquela conversa.
"Eu sou igual a você", a frase saiu da boca dela como se isso fosse a coisa mais óbvia do mundo. E rapidamente ela se virou e começou a caminhar para longe dali.
Até que subitamente parou, se virou de novo para o menino e gritou: "a diferença é que eu já aprendi que é muito melhor escolher as minhas próprias cores, do que ficar esperando que os outros me deem aquelas que eles acham que eu mereço".
Como em um passe de mágica a menina não estava mais ali e o menino começou a pensar que talvez verde ficasse melhor nele do que azul...
E aí? Quais cores você acha que ficam bem em você?
Eu gosto de preto… talvez alguém da minha família grite nesse momento “emo, sadzinha”, mas fazer o quê, né?
Até semana que vem, tchauzinho. ;)